Publicada por
Filipa
à(s)
5:48 da tarde
Acabei hoje de ler o livro "Comer, orar, amar" da Elizabeth Gilbert. Antes de me censurar por não ter jeito para escrever e aperceber-me que me é tão dificil resumir tudo aquilo que ficou, deixo-vos aqui o capítulo 49. É provavelmente a parte do livro com a qual me identifiquei mais e foi engraçado ver a autora a escolhê-la para ler numa entrevista dada sobre o livro. Foi assim que ela própria decidiu falar sobre o livro. Aqui fica.
“Quando tinha 9 anos, a caminho dos 10, sofri uma verdadeira crise metafísica. Talvez pareça cedo de mais para isso, mas sempre fui uma criança precoce. Tudo aconteceu durante o Verão entre o quarto e o quinto ano. Ia fazer 10 anos em Julho e havia alguma coisa na transição dos 9 para os 10 – de um único dígito para dois – que me deixava num genuíno pânico existencial, normalmente reservado às pessoas que faziam 50 anos. Lembro-me de pensar que a vida estava a passar tão depressa. Ainda ontem andava no infantário e ali estava eu, prestes a fazer 10 anos. Em breve seria adolescente, depois de meia-idade, depois idosa e por fim morreria. E todas as outras pessoas também estavam a envelhecer a uma velocidade espantosa. Os meus pais iam morrer. Os meus amigos iam morrer. O meu gato ia morrer. A minha irmã mais velha já ia entrar no liceu; parecia que ainda há pouco saíra para o primeiro dia de aulas, de meias até aos joelhos, e agora estava no liceu? Obviamente, não ia faltar muito para que morresse. Qual era o objectivo daquilo tudo?
O mais estranho nesta crise é que não tinha sido desencadeada por nada em particular. Não tinha falecido nenhum amigo ou familiar que pudesse ter-me dado esta primeira noção de mortalidade nem lera ou vira alguma coisa especificamente sobre a morte, ainda nem sequer lera a Charlotte’s Web. Este pânico que se apossou de mim aos 10 anos devia-se ao facto de ter percebido espontaneamente o caminho inevitável para a morte e não tinha vocabulário espiritual que me ajudasse a ultrapassar a situação. Nessa altura, éramos protestantes, e nem sequer devotos. Só dizíamos a oração de graças no Natal e no jantar de Acção de Graças e íamos à Igreja esporadicamente. O meu pai optava por ficar em casa aos domingos de manhã, centrando antes a devoção na agricultura. Eu cantava no coro porque gostava de cantar, a minha linda irmã era o anjo no cortejo de Natal. A minha mãe usava a igreja como quartel-general a partir do qual organizava acções de trabalho voluntário em prol da comunidade. Mas mesmo na igreja não me lembrava de ouvir falar muito de Deus. Estávamos em Nova Inglaterra e a palavra Deus tem tendência a enervar os naturais da região.
O meu sentimento de impotência era esmagador. Aquilo que eu queria fazer era puxar algum travão de emergência do universo, como os travões que vira no metropolitano durante a nossa visita escolar à cidade de Nova Iorque. Queria pedir um intervalo para que toda a gente PARASSE até eu conseguir compreender tudo. Suponho que esta necessidade de fazer o mundo inteiro parar até eu conseguir recompor-me pode ter sido o início daquilo a que o meu querido amigo Richard do Texas chama problemas de controlo. É claro que os meus esforços e preocupação eram fúteis. Quanto mais vigiava o tempo, mais depressa ele corria, e esse Verão passou tão rapidamente que me fez dor de cabeça e lembro-me de pensar, ao final de cada dia, mais outro que passou, e desatar a chorar.
Tenho um amigo de liceu que trabalha agora com deficientes mentais e ele diz que os pacientes autistas têm uma consciência particularmente aguda da passagem do tempo, como se não tivessem o filtro mental que permite às pessoas esquecerem de vez em quando a mortalidade e viverem apenas. Um dos pacientes de Rob pergunta-lhe sempre a data todos os dias de manhã e à noite volta a perguntar: “Rob, quando é que vai ser outra vez 4 de Fevereiro?” e antes que o Rob tenha oportunidade de responder, ele abana a cabeça com pena e diz “Já sei, já sei, não te incomodes… só no próximo ano, não é?”.
Conheço intimamente este sentimento. Conheço o triste anseio de adiar o final de outro 4 de Fevereiro. Esta tristeza é uma das maiores provações da experiência humana. Tanto quanto sabemos, somos a única espécie no planeta a quem foi dado o dom – ou a maldição – de ter consciência da sua mortalidade. Tudo aqui acaba por morrer; somos apenas os felizardos que pensam neste facto todos os dias. Como é que vamos lidar com esta informação? Quando tinha 9 anos, não conseguia fazer mais nada a não ser chorar. Mais tarde, com os anos, a minha consciência hipersensível da velocidade do tempo levou-me a querer viver a vida com a maior intensidade possível. Se a minha passagem na Terra ia ser assim tão breve, tinha de fazer tudo o que estivesse ao meu alcance para aproveitar o momento presente. Daí aquelas viagens todas, os romances, a ambição, a massa… A minha irmã tinha um amigo que pensava que a Catherine tinha 2 ou 3 irmãs mais novas porque estava sempre a ouvir histórias sobre a irmã que estava em África, a irmã que estava a trabalhar num rancho no Wyoming, a irmã que era empregada de bar em Nova Iorque, a irmã que estava a escrever um livro, a irmã que ia casar… É claro que isto não podia ser uma pessoa só. Na verdade, se pudesse dividir-me em muitas Liz Gilbert, tê-lo-ia feito de boa vontade, para não perder um único momento da vida. Que estou eu a dizer? Eu dividi-me mesmo em muitas Liz Gilbert, mas todas elas caíram de exaustão em simultâneo uma noite, no chão de uma casa de banho dos subúrbios por volta dos 30 anos.
Devo dizer aqui que tenho consciência de que nem toda a gente passa por este tipo de crise metafísica. Alguns de nós parecem ansiosos em relação à mortalidade ao passo que outros parecem lidar bem com o assunto. Encontramos muita gente apática neste mundo, é claro, mas também conhecemos pessoas que parecem ser capazes de aceitar sem problemas os termos em que o universo opera e que parecem não se deixar perturbar pelos seus paradoxos e injustiças. Tenho uma amiga cuja avó lhe costumava dizer: “ Não há nada neste mundo assim tão grave que não possa ser curado com um banho quente, um copo de uísque e o livro de orações”.
Para algumas pessoas, isso basta. Para outras, são necessárias medidas mais drásticas.
E agora vou falar do meu amigo produtor de leite irlandês que, à primeira vista, era alguém muito improvável de encontrar num ashram indiano. Mas o Sean é uma daquelas pessoas como eu, que nasceram com a louca necessidade de compreender os mecanismos da existência. A sua pequena paróquia em County Cork não parecia ter nenhuma dessas respostas, por isso ele deixou a quinta no início dos anos 80 para viajar pela Índia, à procura da paz interior através do ioga. Alguns anos depois, regressou à quinta na Irlanda. Estava sentado na cozinha da velha casa de pedra com o pai – agricultor de longa data e homem de poucas palavras – e o Sean estava a contar-lhe as suas descobertas espirituais no exótico Oriente. O pai de Sean ouviu com interesse moderado, enquanto observava o fogo na lareira e fumava o seu cachimbo. Não disse nada até o Sean ter dito: “Pai, esta coisa da meditação é crucial para ensinar a serenidade. Pode mesmo salvar-te a vida. Ensina-te a acalmar a mente.”
O pai virou-se para ele e disse gentilmente: “Eu já tenho uma mente calma, filho” e depois voltou a fixar a lareira.
Mas eu não. Nem o Sean. Muitos de nós não a temos. Muitos de nós olham para o fogo e só vêem o Inferno. Tenho de aprender a fazer aquilo que o pai do Sean, segundo parece, nasceu a saber – como Walt Whitman escreveu em tempos, a estar “à parte dos puxões e arrepelos… divertido, complacente, compassivo, ocioso, unitário… simultaneamente dentro e fora do jogo, observando e maravilhando-me com tudo”. Contudo, em vez de estar divertida, estou apenas ansiosa. Em vez de observar, estou sempre a esquadrinhar e a interferir. No outro dia, disse a Deus em oração: Olha! Compreendo que não valha a pena viver uma vida sem a supervisionar, mas achas que um dia posso vir a comer um almoço sem supervisão?
O budismo tem uma história sobre os momentos que se seguiram à transcendência que fez do Buda um ser iluminado. Quando, após 39 dias de meditação, o véu da ilusão finalmente caiu e os verdadeiros mecanismos do universo foram revelados ao grande mestre, diz-se que abriu os olhos e disse de imediato: “Isto não pode ser ensinado.”
Mas depois mudou de ideias, decidiu que afinal iria correr mundo e tentar ensinar a prática da meditação a um pequeno grupo de alunos. Ele sabia que só haveria uma pequena percentagem de pessoas que seriam servidas pelos seus ensinamentos (ou que estariam interessadas neles). Ele dizia que a maior parte da humanidade tinha os olhos tão cheios de poeira da desilusão que nunca veriam a verdade, por mais ajudas que tivessem. Outras pessoas (como o pai de Sean, talvez) já são tão perspicazes e calmas que não precisam de instrução ou ajuda seja de que tipo for. Mas também há aquelas cujos olhos têm apenas uma ligeira poeira e que, com a ajuda do mestre certo, poderão ser ensinadas a ver mais claramente um dia. O Buda decidiu que se tornaria professor em benefício dessa minoria – as que tinham pouca poeira.
Espero sinceramente ser uma dessas pessoas com pouca poeira nos olhos, mas não sei. Só sei que tenho sentido o impulso de encontrar a paz interior com métodos que podem parecer um pouco drásticos para a população em geral. Por exemplo, quando disse a um amigo na cidade de Nova Iorque que ia para a Índia viver num ashram e procurar a divindade, ele suspirou e disse: “Oh, há uma parte de mim que gostava tanto que eu quisesse fazer isso… mas na realidade não tenho nenhum desejo de o fazer.”
Contudo, não creio que tivesse muita escolha. Tinha procurado freneticamente o contentamento durante tantos anos e de tantas formas e todas essas aquisições e façanhas acabam sempre por nos deixar exaustos. Se continuarmos a perseguir a vida dessa maneira, ela acabará por nos levar à morte. O tempo, quando perseguido como um bandido, comportar-se-á como se também o fosse; sempre com avanço em relação a nós, mudando de nome e de cor de cabelo para nos iludir, batendo com a porta das traseiras do motel assim que transpomos a soleira da porta principal como um mandado de busca, deixando apenas uma ponta de cigarro no cinzeiro para fazer pouco de nós. Vamos ter de parar em algum ponto porque ele não o fará. Teremos de admitir que não conseguimos apanhá-lo. Que não é suposto apanharmo-lo. Em algum ponto, como o Richard me está sempre a dizer, temos de deixá-lo ir e sentarmo-nos quietos, permitindo que o contentamento venha até nós.
É claro que deixá-lo ir é algo de assustador para quem acredita que o mundo só gira porque tem um manípulo em cima dele, que cada um de nós roda à sua maneira, e que se largássemos esse manípulo por um momento que fosse – bem, isso seria o fim do nosso universo. “Mas tenta largá-lo, Mercearias”. É esta a mensagem que estou a receber. Senta-te calmamente por agora e pára de participar. Observa o que acontece. Afinal, os pássaros não caem a meio do voo, as árvores não secam nem morrem, os rios não ficam vermelhos de sangue. A vida continua. Até a estação de correios italiana continuará a funcionar com as suas dificuldades sem ti – por que razão tens tanta certeza de que a tua microgestão de todos os momentos é assim tão essencial para o mundo inteiro? Porque não deixas apenas correr as coisas?
Ouço este argumento e atrai-me. Do ponto de vista intelectual, acredito nele. A sério. Mas depois começo a perguntar-me – com a minha interminável ansiedade, com todo o meu exagerado fervor e com esta minha natureza estupidamente faminta – o que devo fazer com a minha energia.
Esta resposta também chega: “Procura Deus”, sugere a minha guru. “Procura Deus como um homem com a cabeça a arder procura água.”
O mais estranho nesta crise é que não tinha sido desencadeada por nada em particular. Não tinha falecido nenhum amigo ou familiar que pudesse ter-me dado esta primeira noção de mortalidade nem lera ou vira alguma coisa especificamente sobre a morte, ainda nem sequer lera a Charlotte’s Web. Este pânico que se apossou de mim aos 10 anos devia-se ao facto de ter percebido espontaneamente o caminho inevitável para a morte e não tinha vocabulário espiritual que me ajudasse a ultrapassar a situação. Nessa altura, éramos protestantes, e nem sequer devotos. Só dizíamos a oração de graças no Natal e no jantar de Acção de Graças e íamos à Igreja esporadicamente. O meu pai optava por ficar em casa aos domingos de manhã, centrando antes a devoção na agricultura. Eu cantava no coro porque gostava de cantar, a minha linda irmã era o anjo no cortejo de Natal. A minha mãe usava a igreja como quartel-general a partir do qual organizava acções de trabalho voluntário em prol da comunidade. Mas mesmo na igreja não me lembrava de ouvir falar muito de Deus. Estávamos em Nova Inglaterra e a palavra Deus tem tendência a enervar os naturais da região.
O meu sentimento de impotência era esmagador. Aquilo que eu queria fazer era puxar algum travão de emergência do universo, como os travões que vira no metropolitano durante a nossa visita escolar à cidade de Nova Iorque. Queria pedir um intervalo para que toda a gente PARASSE até eu conseguir compreender tudo. Suponho que esta necessidade de fazer o mundo inteiro parar até eu conseguir recompor-me pode ter sido o início daquilo a que o meu querido amigo Richard do Texas chama problemas de controlo. É claro que os meus esforços e preocupação eram fúteis. Quanto mais vigiava o tempo, mais depressa ele corria, e esse Verão passou tão rapidamente que me fez dor de cabeça e lembro-me de pensar, ao final de cada dia, mais outro que passou, e desatar a chorar.
Tenho um amigo de liceu que trabalha agora com deficientes mentais e ele diz que os pacientes autistas têm uma consciência particularmente aguda da passagem do tempo, como se não tivessem o filtro mental que permite às pessoas esquecerem de vez em quando a mortalidade e viverem apenas. Um dos pacientes de Rob pergunta-lhe sempre a data todos os dias de manhã e à noite volta a perguntar: “Rob, quando é que vai ser outra vez 4 de Fevereiro?” e antes que o Rob tenha oportunidade de responder, ele abana a cabeça com pena e diz “Já sei, já sei, não te incomodes… só no próximo ano, não é?”.
Conheço intimamente este sentimento. Conheço o triste anseio de adiar o final de outro 4 de Fevereiro. Esta tristeza é uma das maiores provações da experiência humana. Tanto quanto sabemos, somos a única espécie no planeta a quem foi dado o dom – ou a maldição – de ter consciência da sua mortalidade. Tudo aqui acaba por morrer; somos apenas os felizardos que pensam neste facto todos os dias. Como é que vamos lidar com esta informação? Quando tinha 9 anos, não conseguia fazer mais nada a não ser chorar. Mais tarde, com os anos, a minha consciência hipersensível da velocidade do tempo levou-me a querer viver a vida com a maior intensidade possível. Se a minha passagem na Terra ia ser assim tão breve, tinha de fazer tudo o que estivesse ao meu alcance para aproveitar o momento presente. Daí aquelas viagens todas, os romances, a ambição, a massa… A minha irmã tinha um amigo que pensava que a Catherine tinha 2 ou 3 irmãs mais novas porque estava sempre a ouvir histórias sobre a irmã que estava em África, a irmã que estava a trabalhar num rancho no Wyoming, a irmã que era empregada de bar em Nova Iorque, a irmã que estava a escrever um livro, a irmã que ia casar… É claro que isto não podia ser uma pessoa só. Na verdade, se pudesse dividir-me em muitas Liz Gilbert, tê-lo-ia feito de boa vontade, para não perder um único momento da vida. Que estou eu a dizer? Eu dividi-me mesmo em muitas Liz Gilbert, mas todas elas caíram de exaustão em simultâneo uma noite, no chão de uma casa de banho dos subúrbios por volta dos 30 anos.
Devo dizer aqui que tenho consciência de que nem toda a gente passa por este tipo de crise metafísica. Alguns de nós parecem ansiosos em relação à mortalidade ao passo que outros parecem lidar bem com o assunto. Encontramos muita gente apática neste mundo, é claro, mas também conhecemos pessoas que parecem ser capazes de aceitar sem problemas os termos em que o universo opera e que parecem não se deixar perturbar pelos seus paradoxos e injustiças. Tenho uma amiga cuja avó lhe costumava dizer: “ Não há nada neste mundo assim tão grave que não possa ser curado com um banho quente, um copo de uísque e o livro de orações”.
Para algumas pessoas, isso basta. Para outras, são necessárias medidas mais drásticas.
E agora vou falar do meu amigo produtor de leite irlandês que, à primeira vista, era alguém muito improvável de encontrar num ashram indiano. Mas o Sean é uma daquelas pessoas como eu, que nasceram com a louca necessidade de compreender os mecanismos da existência. A sua pequena paróquia em County Cork não parecia ter nenhuma dessas respostas, por isso ele deixou a quinta no início dos anos 80 para viajar pela Índia, à procura da paz interior através do ioga. Alguns anos depois, regressou à quinta na Irlanda. Estava sentado na cozinha da velha casa de pedra com o pai – agricultor de longa data e homem de poucas palavras – e o Sean estava a contar-lhe as suas descobertas espirituais no exótico Oriente. O pai de Sean ouviu com interesse moderado, enquanto observava o fogo na lareira e fumava o seu cachimbo. Não disse nada até o Sean ter dito: “Pai, esta coisa da meditação é crucial para ensinar a serenidade. Pode mesmo salvar-te a vida. Ensina-te a acalmar a mente.”
O pai virou-se para ele e disse gentilmente: “Eu já tenho uma mente calma, filho” e depois voltou a fixar a lareira.
Mas eu não. Nem o Sean. Muitos de nós não a temos. Muitos de nós olham para o fogo e só vêem o Inferno. Tenho de aprender a fazer aquilo que o pai do Sean, segundo parece, nasceu a saber – como Walt Whitman escreveu em tempos, a estar “à parte dos puxões e arrepelos… divertido, complacente, compassivo, ocioso, unitário… simultaneamente dentro e fora do jogo, observando e maravilhando-me com tudo”. Contudo, em vez de estar divertida, estou apenas ansiosa. Em vez de observar, estou sempre a esquadrinhar e a interferir. No outro dia, disse a Deus em oração: Olha! Compreendo que não valha a pena viver uma vida sem a supervisionar, mas achas que um dia posso vir a comer um almoço sem supervisão?
O budismo tem uma história sobre os momentos que se seguiram à transcendência que fez do Buda um ser iluminado. Quando, após 39 dias de meditação, o véu da ilusão finalmente caiu e os verdadeiros mecanismos do universo foram revelados ao grande mestre, diz-se que abriu os olhos e disse de imediato: “Isto não pode ser ensinado.”
Mas depois mudou de ideias, decidiu que afinal iria correr mundo e tentar ensinar a prática da meditação a um pequeno grupo de alunos. Ele sabia que só haveria uma pequena percentagem de pessoas que seriam servidas pelos seus ensinamentos (ou que estariam interessadas neles). Ele dizia que a maior parte da humanidade tinha os olhos tão cheios de poeira da desilusão que nunca veriam a verdade, por mais ajudas que tivessem. Outras pessoas (como o pai de Sean, talvez) já são tão perspicazes e calmas que não precisam de instrução ou ajuda seja de que tipo for. Mas também há aquelas cujos olhos têm apenas uma ligeira poeira e que, com a ajuda do mestre certo, poderão ser ensinadas a ver mais claramente um dia. O Buda decidiu que se tornaria professor em benefício dessa minoria – as que tinham pouca poeira.
Espero sinceramente ser uma dessas pessoas com pouca poeira nos olhos, mas não sei. Só sei que tenho sentido o impulso de encontrar a paz interior com métodos que podem parecer um pouco drásticos para a população em geral. Por exemplo, quando disse a um amigo na cidade de Nova Iorque que ia para a Índia viver num ashram e procurar a divindade, ele suspirou e disse: “Oh, há uma parte de mim que gostava tanto que eu quisesse fazer isso… mas na realidade não tenho nenhum desejo de o fazer.”
Contudo, não creio que tivesse muita escolha. Tinha procurado freneticamente o contentamento durante tantos anos e de tantas formas e todas essas aquisições e façanhas acabam sempre por nos deixar exaustos. Se continuarmos a perseguir a vida dessa maneira, ela acabará por nos levar à morte. O tempo, quando perseguido como um bandido, comportar-se-á como se também o fosse; sempre com avanço em relação a nós, mudando de nome e de cor de cabelo para nos iludir, batendo com a porta das traseiras do motel assim que transpomos a soleira da porta principal como um mandado de busca, deixando apenas uma ponta de cigarro no cinzeiro para fazer pouco de nós. Vamos ter de parar em algum ponto porque ele não o fará. Teremos de admitir que não conseguimos apanhá-lo. Que não é suposto apanharmo-lo. Em algum ponto, como o Richard me está sempre a dizer, temos de deixá-lo ir e sentarmo-nos quietos, permitindo que o contentamento venha até nós.
É claro que deixá-lo ir é algo de assustador para quem acredita que o mundo só gira porque tem um manípulo em cima dele, que cada um de nós roda à sua maneira, e que se largássemos esse manípulo por um momento que fosse – bem, isso seria o fim do nosso universo. “Mas tenta largá-lo, Mercearias”. É esta a mensagem que estou a receber. Senta-te calmamente por agora e pára de participar. Observa o que acontece. Afinal, os pássaros não caem a meio do voo, as árvores não secam nem morrem, os rios não ficam vermelhos de sangue. A vida continua. Até a estação de correios italiana continuará a funcionar com as suas dificuldades sem ti – por que razão tens tanta certeza de que a tua microgestão de todos os momentos é assim tão essencial para o mundo inteiro? Porque não deixas apenas correr as coisas?
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trás o livro para cá!!!!!!
is this your way of saying i as your sister was so beautiful i could've been the angel in the xmas show??!!!!
Anónimo disse...
1:51 da tarde
Pa pa pá
Anónimo disse...
10:41 da tarde
AMEI!
Anónimo disse...
2:36 da tarde
O video no TED está óptimo:
http://www.ted.com/talks/elizabeth_gilbert_on_genius.html
Anónimo disse...
12:10 da manhã
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Anónimo disse...
5:12 da manhã